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Blog da Associados

O que você não pode deixar de saber sobre cancelamento de hospedagem

26 de dez de 2024

4 min de leitura

Por Alberto Dantas, sócio-fundador



1. Introdução


O cancelamento de hospedagem é um tema recorrente nas relações de consumo, especialmente em um contexto de crescente globalização e digitalização do setor de turismo. Este artigo tem como objetivo analisar as questões jurídicas relacionadas ao cancelamento de hospedagens, tanto em hotéis localizados no Brasil quanto no exterior, à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e da legislação cível aplicável. Serão abordadas as diferenças no tratamento jurídico desses cancelamentos, as implicações de reservas feitas por meio de plataformas online, e os direitos e deveres de consumidores e fornecedores em diferentes jurisdições.

 

2. Relação de Consumo e Princípio da Boa-fé


Em qualquer contrato de hospedagem, seja no Brasil ou no exterior, a relação entre o consumidor e o fornecedor é regida pelo princípio da boa-fé objetiva, que exige transparência, ética e equilíbrio nas relações contratuais. No Brasil, essa relação é regulada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), que protege o consumidor como parte vulnerável, assegurando seus direitos contra práticas abusivas.

No caso de reservas internacionais, a aplicação do CDC pode ser limitada, mas o princípio da boa-fé continua sendo essencial, tanto no contexto da legislação brasileira quanto nas normas de outros países. Cláusulas contratuais que violam este princípio podem ser contestadas, embora a eficácia da contestação dependa da jurisdição.

 

3. Direito de Arrependimento e Cancelamento de Hospedagem


No Brasil, o CDC assegura o direito de arrependimento ao consumidor, conforme o art. 49, para compras realizadas fora do estabelecimento comercial, incluindo reservas feitas online. O consumidor pode desistir do contrato no prazo de sete dias a contar da contratação, sem necessidade de justificativa e com direito à restituição integral dos valores pagos.


Este direito é especialmente relevante em casos de reservas feitas em hotéis brasileiros. No entanto, ao tratar de reservas internacionais, o direito de arrependimento pode não ser aplicável, uma vez que a legislação do país onde o hotel está localizado prevalece. Muitos países não possuem uma regra equivalente ao art. 49 do CDC, o que limita a possibilidade de cancelamento sem custos.

 

4. Cláusulas Contratuais e Multas de Cancelamento


Tanto no Brasil quanto no exterior, os contratos de hospedagem geralmente incluem cláusulas que estabelecem prazos e penalidades para cancelamento. No Brasil, o CDC restringe a validade de cláusulas abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, IV). As multas de cancelamento devem ser proporcionais e justificadas, não podendo resultar em enriquecimento sem causa do fornecedor.


Em reservas internacionais, no entanto, as cláusulas contratuais serão regidas pela legislação local. O consumidor brasileiro que faz uma reserva em um hotel no exterior deve estar atento às políticas de cancelamento e reembolso do país de destino. Cláusulas que possam parecer abusivas sob a ótica do CDC podem ser consideradas válidas em outras jurisdições.

 

5. Caso Fortuito e Força Maior


Tanto o Código Civil brasileiro quanto legislações de outros países reconhecem que eventos de caso fortuito ou força maior podem justificar o cancelamento de hospedagem sem penalidades. Eventos como pandemias, desastres naturais e outras situações imprevisíveis e inevitáveis permitem ao consumidor cancelar a reserva sem sofrer as penalidades previstas no contrato.


No contexto internacional, a aplicação desse princípio dependerá das normas locais e das políticas adotadas por cada hotel ou plataforma de reservas. É importante verificar se o contrato inclui cláusulas específicas para eventos de força maior e como elas são tratadas na legislação do país onde o serviço será prestado.

 

6. Plataformas de Reserva Online e Responsabilidade Solidária


As plataformas digitais de reserva de hospedagem, como Booking, Airbnb e outras, desempenham um papel importante nas relações de consumo. No Brasil, o CDC prevê a responsabilidade solidária entre todos os fornecedores que participam da cadeia de fornecimento do serviço (art. 18). Isso significa que, em caso de cancelamento e eventual recusa na devolução de valores, tanto a plataforma quanto o estabelecimento podem ser responsabilizados.


Em reservas internacionais, a situação pode ser mais complexa. Se a plataforma tem representação no Brasil ou atua de forma direcionada ao consumidor brasileiro, o CDC pode ser aplicável em relação à plataforma. No entanto, a aplicação das regras do CDC pode ser limitada em relação ao hotel estrangeiro, que estará sujeito à legislação local.

 

7. Considerações sobre a Jurisdição


Quando o cancelamento envolve um hotel no exterior, a questão da jurisdição se torna central. Em princípio, as disputas devem ser resolvidas no país onde o serviço será prestado, conforme estipulado nos contratos. No entanto, se a reserva foi intermediada por uma plataforma brasileira, o consumidor pode optar por ajuizar uma ação no Brasil, com base na legislação consumerista nacional.


Em disputas internacionais, a execução de decisões judiciais brasileiras no exterior pode enfrentar obstáculos, como a ausência de tratados de cooperação jurídica entre os países envolvidos ou diferenças significativas na legislação aplicável.

 

8. Conclusão


O cancelamento de hospedagem envolve questões jurídicas complexas, que variam de acordo com a localização do hotel e a legislação aplicável. No Brasil, o Código de Defesa do Consumidor oferece proteção robusta ao consumidor, garantindo direitos como o arrependimento e a contestação de cláusulas abusivas. No entanto, em reservas internacionais, o consumidor deve estar ciente das limitações da aplicação do CDC e das regras locais do país de destino.


Em ambos os casos, o princípio da boa-fé deve nortear a relação contratual, e as cláusulas de cancelamento devem ser analisadas com cuidado. Plataformas de reserva online também têm responsabilidade na proteção dos direitos do consumidor, especialmente quando atuam no Brasil.