
Blog da Associados
Por Rayane Lins, sócia coordenadora da área cível.

A importância fundamental da posse, é que se diz direito das coisas e não direito real, logo, não é espécie do gênero direito real. Enquanto o direito real confere à pessoa um poder jurídico direto e absoluto sobre a coisa (como a propriedade), a posse é a manifestação exteriorizada de alguns desses poderes, não sendo, por si só, um direito real. A posse, portanto, se encaminha de modo oposto à propriedade, ela introduz o direito das coisas.
Apesar de ser muito bem compreendida de forma popular, a posse gera discussões no meio do campo jurídico, englobando certas dúvidas, em virtude dos posicionamentos divergentes entre os juristas na sua classificação e apreciação.
Há quem sustente que o direito é interesse juridicamente protegido, logo, a posse seria um direito e não o poder de fato, reconhecido e protegido pelo direito.
No entanto, a orientação majoritária no Brasil é de que a posse é poder de fato sobre coisa, reconhecido e protegido pelo direito. Isso se extrai do Código Civil, artigo 1.196, que não trata da posse e nem define a posse, mas sim o possuidor: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.”
Atente, que é o exercício, não é o direito e nem a imagem e semelhança do direito, mas sim de algum dos poderes, mas não do direito. São direitos inerentes à propriedade, mas não emanados da propriedade.
A posse é tão forte que chega a fazer fronteira com o próprio direito de propriedade, sob a proteção processual contra o próprio proprietário, cujo exemplo marcante é a usucapião, afastando a propriedade e instalando outra propriedade sobre aquela coisa, em virtude da posse e ainda, nesse sentido, como aquisição originária.
Então, a posse do possuidor pode ser compartilhada com a posse do proprietário, como no caso da locação, com a posse direta do locatário compartilhada com a posse indireta do locador-proprietário.
Outro exemplo são as Terras Públicas, que são constitucionalmente inalienáveis. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem decidido que a ocupação dessas terras públicas, não caracteriza posse e sim mera detenção. O que acaba por construir um entendimento equivocado para alguns juristas, posto que não caberia o termo “detenção”, mas que seria sim uma posse ilegal, não protegida e precária.
A posse não se contém apenas no direito das coisas, pois é mencionada em outros campos do direito e tratados de forma explícita no Código Civil Brasileiro, com significados bem distintos do tratado agora, como a posse do estado filiação (art. 1.605), a posse do estado de casados (art. 1.545), a posse da herança (art. 1.791).
E o que justifica a proteção da posse? Historicamente, é pela utilidade e pelo uso da coisa. São fatores subjacentes que legitimam e fundamentam a posse, a proteção jurídica se dá inclusive contra o proprietário, como afirmado anteriormente.
Outra consequência relevante desse tema é o chamado direito à posse, que por sua vez, não significa direito de posse. Quem tem direito à posse é o proprietário, o titular de alguns direitos reais (ressalvando que alguns dispensam a posse) e em relações jurídicas obrigacionais, como a locação, o comodato, o depósito, de modo que o locatário, o comodatário, o depositário têm direito à posse. Assim como no exemplo do artigo 1.394 do Código Civil: “O usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos.”, dentre outros.
Nota-se que é no direito das coisas que a posse assume a sua relevância e afirma a sua singularidade.